4.2.09

Albano

O Albano foi um grande redactor, um grande criativo e um grande presidente de agência. Tudo isto foi possível, porque o Albano faz parte daquele grupo muito restrito de gente culta e informada que é capaz de ouvir e resolver problemas, que pensa fora das convenções e anda com as coisas para a frente. Enfim faz parte do infelizmente restrito grupo das pessoas inteligentes que felizmente é desproporcionalmente grande nas profissões criativas.
Há dois tipos de problemas: os que já foram resolvidos e têm por isso normas e os passos bem definidos para serem resolvidos outra vez. E os que são novos e para os quais é preciso inventar/descobrir a solução. Os primeiros qualquer manga de alpaca resolve, basta ter memória e disciplina, os segundos precisam, para além de disciplina e memória, de capacidade para ver relações onde elas aparentemente não existem. As profissões criativas, as profissões da produção do novo - e não estou obviamente a falar apenas publicitários, arquitectos, designers ou realizadores mas de toda e qualquer profissão onde fazer diferente faz a diferença - precisam de pessoas com estas capacidades, precisam de Albanos.
Isto não quer dizer que não haja gente estúpida nas profissões criativas pois há e aos pontapés (ou pelo a merecerem-nos) o que se deve ao facto de a excentricidade de muitas pessoas inteligentes, por vezes apenas um subproduto de um genuino alheamento (o Albano mesmo de fato dificilmente mantinha a fralda da camisa pra dentro das calças) depois ser usada como sinal exterior de uma inexistente cabeça; como o fato impecável é sinal de uma seriedade que esconde o bandido, ou o sorriso encantador dissimula o psicopata.
Enfim desviei-me do assunto que era o Albano e a inteligência e os criativos. Mas qual é que é mesmo o assunto? Peguntaram os poucos que aqui chegaram.
O assunto é o baixo valor que o nosso negócio, o das marcas e da sua comunicação, tem vindo a dar à criatividade, à inteligência e por conseguinte ao que lhe dá valor.
Durante a última década a criatividade tem sido atacada como coisa má.
Tem sido promovida cá dentro a ideia que os negócios, as empresas e as marcas não necessitam de criatividade. Bastam consultores de fato e gravata e uma série de exemplos do que se faz lá para copiar cá.
Claro que este pensamento tem vindo a estender-se a todo o lado, até às industrias criativas onde o famoso benchmarking era há muito conhecido como “picanço”. É sem dúvida um modelo de negócio mais rentável no imediato se não contarmos claro está, com o facto de 80% do que é comunicado pelas marcas ser dinheiro deitado à rua, porque ninguém se lembra, porque não tem interesse, é irrelevante, mal feito numa palavra incompetente.
Há concorrentes nossos que fazem publicamente a apologia do pagar mal aos que têm o dever de fazer diferente, inventar, solucionar problemas enfim de ser criativos, fazendo mesmo gala de pagar menos do que a outros mesmo que bem menos inteligentes. Claro que com o que pagam não conseguem criativos mas apenas mangas de alpaca promovendo assim junto dos clientes a ilusão da criatividade, o que é sempre mais fácil e dá melhores reuniões, onde se fala dos criativos, não com a nobreza que o adjectivo encerra mas como uma corja de gente que tem que se ter em casa como a criadagem e que é assunto de conversa de comadres. “Os meus criativos isto os meus criativos aquilo”.
Tudo isto des-vende a criatividade e é promovido por quem não a tem para vender.
Eu tenho tido a sorte de trabalhar com muitos criativos. Alguns inclusive no departamente criativo. O Albano foi um deles. Fez uma belíssima carreira e que depois e fartou de aturar gente bem menos inteligente do que ele. Como a muitos amigos que trabalham no nosso metier, ouvi-o desabafar sobre a fala de bom senso, a estupidez, a falta de respeito por quem tem um trabalho dos mais stressantes, intensos e desgastantes. Sobre quem não vê o bom do mau, de quem não destingue ouro de latão, uma ideia vencedora de um flop, de quem passa ao lado da hipotese de fazer crescer as suas marcas, os seus produtos e a sua carreira.
E ai o Albano decidiu mudar de carreira e ao fazê-lo provou que nada tráz mais valor a um negócio do que inteligência e criatividade.
Abriu o H3 (com mais dois sócios) e fez o que poucos, muito poucos conseguiriam fazer: uma marca de sucesso, um negócio próspero, numa das categorias mais dificeis e que tem como referência um das marcas mais icónicas do mundo, uma daquelas adoradas por legiões de pms e wannabe marketing gurus, a McDonalds. Há muitos anos atrás ouvi um director de Marketing dizer que queria ser o McDonalds da distribuição, vejam bem. Já ouvi outro dizer que queria ser o McDonalds das telecomunicações (ou seria o mesmo?). Pois eles deveriam querer ser o H3 da distribuição ou melhor, deveriam querer ser o Albano eles próprios e fazer as coisas com cabeça, tronco, membros, visão, intuição e de raiz sem copiar ninguém e entendendo o que o consumidor quer. Foi o que ele fez no H3 e no caminho provou que afinal ser criativo e inteligente é diferente e tráz valor. Muito valor.
O Albano hoje faz (salvo seja) humburgeres e ao fazê-lo provou que se mais Albanos houvesse melhor estava o país, provou que não é preciso copiar benchmarcar, provou que tinha razão no que proponha e pregava aos clientes e provou-o fazendo-o.
Infelizmente a nossa industria tem vindo a prescindir do que lhe trás valor, os Albanos e no processo a ficar pior por isso.

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